Com a chegada do Web Summit ao Rio de Janeiro em maio, o Brasil terá a oportunidade de se tornar um palco global para o que está sendo feito de mais inovador na área de tecnologia. “Muitas vezes, o mundo vê apenas o pior do Brasil, como as notícias sobre o desmatamento da Amazônia. O festival irá mostrar o que há de melhor no país e dar visibilidade internacional às empresas brasileiras”, afirma Paddy Cosgrave, CEO e cofundador do evento.
Criado em 2009 em Dublin, na Irlanda, o megafestival de inovação e tecnologia atrai todos os anos mais de 70 mil pessoas para Lisboa, cidade que abriga o evento desde 2016. Este ano, a empresa de Cosgrave, que também está por trás do Collision, em Toronto, e do RISE, em Hong Kong, inaugura a primeira edição do festival fora da Europa: o Web Summit Rio. A expectativa é que 15 mil pessoas participem da conferência entre os dias 1º e 4 de maio, no Riocentro, na Barra da Tijuca.
O empreendedor irlandês de 39 anos lembra que já passaram pelo palco do Web Summit grandes personalidades globais, como o fundador da SpaceX e dono do Twitter, Elon Musk, o ex-vice-presidente americano Al Gore e a tenista americana Serena Williams. Mas defende que o grande atrativo do festival é a possibilidade de conhecer quem está construindo o futuro dos negócios. “Sabemos que a maioria dos participantes vai ao Web Summit para encontrar empreendedores sobre os quais nunca ouviu falar. Há empresas que tinham apenas dez funcionários quando se apresentaram no evento e hoje estão listadas em bolsa. Esses são os palestrantes mais importantes”, afirma.
Na entrevista a seguir, Cosgrave fala sobre o potencial de o Brasil se tornar um hub de inovação global, as oportunidades de negócios que se abrem em meio à onda de demissões das big techs, a transformação de Lisboa na queridinha dos nômades digitais e as dicas para aproveitar os quatro dias de conferência.
Entre os palestrantes já confirmados no Web Summit deste ano, estão Meredith Whittaker (presidente da Signal), Mate Pencz (co-fundador e CEO da Loft), Kat Graham (atriz norte-americana estrela da série “Diários de um Vampiro”), Amrapali Gan (CEO do OnlyFans) e Gilberto Silva (campeão mundial com a seleção brasileira de futebol em 2002). Ingressos e mais informações sobre o evento no site https://rio.websummit.com/.
Por que vocês decidiram trazer o Web Summit para o Rio de Janeiro?
É a primeira vez que levamos o evento para fora da Europa. O número de brasileiros que vão ao festival em Lisboa cresce a cada ano, refletindo a importância cada vez maior das startups e do ecossistema de inovação no Brasil. Já existem alguns eventos internacionais de negócios na América Latina, mas o Web Summit representa algo verdadeiramente global. Será o nosso primeiro ano, por isso vamos começar de maneira modesta, mas espero que seja possível fazer com que o mundo dos negócios, em particular, o da indústria da tecnologia, se volte para o Rio de Janeiro.
Como o Web Summit pode ajudar o Rio a se tornar um hub de inovação global?
Muitas vezes o mundo vê apenas o pior do Brasil, como as notícias sobre o desmatamento da Amazônia ou a violência nas favelas. O evento irá mostrar um pouco do que há de melhor no Brasil. Será uma plataforma para as empresas brasileiras. Espero que traga companhias de fora que considerem investir, abrir filiais e assinar parcerias no país. E vice-versa: que seja uma oportunidade para que investidores brasileiros encontrem potenciais parceiros e clientes do mundo todo.
Vocês receberam candidaturas de diversas cidades brasileiras para sediar o evento. Por que escolheram o Rio?
Tivemos uma proposta de Brasília, que era mais atraente do ponto de vista financeiro. Mas quando perguntamos a pessoas dos Estados Unidos e da Europa o que achavam da capital brasileira, elas responderam que, para viajar para tão longe, provavelmente iriam com a família e aproveitariam para fazer turismo. Brasília não é o melhor destino de férias, enquanto o Rio é uma cidade absurdamente bonita. As pessoas querem ir a lugares para fazer negócios e desfrutar de ótimos momentos. A fórmula perfeita é combinar as duas coisas em um mesmo lugar.
O que mudou em Lisboa desde a chegada do Web Summit, em 2016? Qual foi o papel do Web Summit nessa transformação?
Quando anunciamos que mudaríamos [de Dublin] para Lisboa, jornalistas americanos, alemães, ingleses e espanhóis nos perguntavam: “Mas por que Lisboa? Lisboa não tem nada”. Recebemos inúmeras críticas na época. Agora, Lisboa tornou-se a queridinha dos profissionais de tecnologia, inúmeras empresas foram para lá, o The New York Times diz que é um dos principais destinos dos nômades digitais. Isso também criou alguns problemas sociais. Algumas pessoas nos culpam pelo fato de hoje a capital portuguesa ter gente demais e o custo de vida estar subindo. Talvez seja nossa “culpa”, ou talvez fosse acontecer de qualquer maneira.
Por que os festivais de inovação fazem tanto sucesso hoje em dia?
O mundo sempre foi fascinado por inovação. No século XIX, as pessoas iam à Exposição Universal para ver a nova invenção de máquina a vapor. Novas ideias sempre fascinaram o público e os jornalistas. Você não vai querer contar a história de algo que já foi feito antes.
O que diferencia o Web Summit de outros festivais de inovação?
Quando eu estava começando a empreender, ia a esses festivais e tudo o que eu via eram palestrantes em cima do palco. Pensava: “Posso ver essa palestra no YouTube. Estou aqui porque quero construir um negócio de sucesso. Como eu, que acabei de sair da faculdade, nunca encontrei um investidor e nunca falei com um jornalista, posso encontrar essas pessoas?”. O Web Summit ajuda a promover esses encontros, é um festival de dates.
Qual é o principal objetivo do Web Summit?
É aumentar as conexões significativas entre os participantes do evento, sejam eles CEOs, startups, investidores, políticos ou jornalistas. Toda a nossa equipe e os softwares que criamos estão voltados para isso. Elon Musk já subiu no nosso palco. E isso é ótimo, ele é o empreendedor mais famoso do mundo. Mas, mais importante do que isso, o Web Summit dá a oportunidade de o participante encontrar um número enorme de pessoas que podem ajudar no negócio dele. As pessoas vão lá para fazer networking, marcar encontros com investidores, CEOs e clientes potenciais.
O inverno das startups torna o Web Summit menos atraente para empresas e investidores?
No ano passado, o Web Summit Lisboa teve ingressos esgotados pela primeira vez na história três semanas antes de seu início. No começo de outubro, já não havia mais ingressos. Quando as coisas ficam difíceis para as startups, elas tendem a se concentrar em como aumentar os lucros. Os investidores dizem: “Não vamos te dar mais dinheiro, você precisa conseguir mais clientes”. E como encontrar mais clientes? O Web Summit ajuda nessas conexões, e por isso é muito atraente para startups.
Há uma onda de demissões em massa nas empresas de tecnologia. Que perspectivas de futuro você enxerga para o setor?
Vemos big techs como Microsoft e Amazon demitindo milhares de pessoas altamente qualificadas, como ocorreu na última recessão. Foi quando muitas das melhores startups do passado começaram. Muita gente altamente qualificada e experiente, que tinha ótimos salários, foi mandada embora. E o que esses milhares de pessoas vão fazer agora? Elas não vão querer voltar a trabalhar num banco tradicional. Algumas até vão, mas a maioria, não. Elas têm poupança e vão querer empreender. A maioria das empresas bem-sucedidas foi aberta por pessoas na faixa dos 40 e poucos anos e não por um garoto de 20 e poucos, recém-saído da universidade. Estatisticamente, 40 e poucos anos é a melhor idade para se abrir uma empresa.
Como vocês escolhem os palestrantes do Web Summit?
Temos uma equipe de 20 jornalistas que trabalham duro, pensando em quem deve falar. Também usamos ciência de dados. Procuramos os “The New Kids on the Block”, os palestrantes que não são óbvios. Web Summit é sobre o futuro. É diferente de conferências de negócios tradicionais. Claro que é bom ter nomes já consolidados, mas sabemos que a maioria dos participantes vai para encontrar empreendedores sobre os quais nunca tinham ouvido falar antes, para aprender com suas ideias. São as empresas do amanhã que interessam. Há muitas companhias que tinham apenas dez funcionários quando falaram no evento e hoje estão listadas em bolsa. Esses são os palestrantes mais importantes. O Web Summit dá a oportunidade de encontrar as pessoas que estão construindo o futuro.
Quais são os próximos passos internacionais do Web Summit? Que regiões devem receber novos eventos?
Nosso próximo foco é o Oriente Médio e a África. Espero que, em 2024, possamos ter um evento no Oriente Médio e talvez um na África em até 2026.
Que conselhos você daria a alguém que pretende ir ao Web Summit Rio?
É preciso se planejar para um evento dessa escala. Vai ser bem corrido, com milhares de pessoas. Não basta simplesmente aparecer na hora e achar que vai conseguir encontrar todo mundo que deseja. As pessoas agendam seus encontros com semanas ou até meses de antecedência. Conheço gente que já começou a marcar reuniões, organizar festas noturnas, procurar locações. Você pode deixar para fazer as coisas de última hora, mas provavelmente não será tão bem-sucedido.
Fonte: O Globo